Oi Grupo!
Vamos começar com uma introdução de como será este nosso estudo. Vamos começar traçando algumas noções gerais. Veremos noções de direito financeiro relacionadas ao Estado, às finanças públicas, à atividade financeira, à constituição financeira e aos sistemas tributário e orçamentário, além das fontes do direito financeiro.
Gostaria comentar com vocês sobre o livro: Curso de Direito Financeiro Brasileiro do Prof. Marcus Abrahan, que recebi outro dia. Achei o livro bastante interessante, apesar de perceber que a distinção da classificação legal de receitas não parece muito clara. Contudo, o livro ainda permanece recomendável pela sua simplicidade ao abordar o tema e riqueza de fontes práticas para complementação do estudo.
Comecemos então.
Introdução. A preocupação politicamente correta está em buscar uma maneira mais equitativa de arrecadação, de desenvolver os mecanismos de gestão do erário público, de governança pública, pautada pela ética, moralidade, transparência, eficiência e responsabilidade. Tudo isso dentro da forma consensualmente ideal de estado: Estado de Direito. Este estado de direito é uma organização motivada pela coletividade, com respeito à aplicação de um ordenamento jurídico, para a realização do bem comum, da paz e da ordem social.
Interessante dissecarmos o que vem a ser "necessidades públicas" - conceito jurídico indeterminado. As necessidades públicas compreendem as necessidades individuais (de cada um de seus integrantes, como a alimentação, vestuário, lazer), coletivas (de grupos de indivíduos, como o policiamento, o transporte), e transindividuais (que tratam de questões de ordem econômica, social, regional, defesa nacional).
O mais importante inicialmente é lembrar que a idéia de necessidade pública deixa claro que o Estado não é um fim em si mesmo!
A Constituição de 1988, texto de caráter normativo (não é um mero programa, uma carta de intenções), traz normas - princípios e regras - influenciadas pela idéia de justiça e de direitos fundamentais. É o que já devemos verificar pela própria redação do seu art. 1º:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Note-se contudo que idéias como a soberania passam a ocupar o mesmo patamar que a dignidade da pessoa humana e a cidadania. Se antes a defesa nacional era o "super trunfo" da ditadura, hoje o "super trunfo" da democracia é a dignidade da pessoa humana.
Quanto à evolução das finanças públicas, neste perfil, tratarão dos instrumentos políticos, econômicos e jurídicos, voltados à captação de recursos financeiros, à administração e aplicação nas necessidades públicas. Encontram-se inseridas nela a atividade financeira, a ciência das finanças e o direito financeiro - três conceitos objeto de nosso foco.
As finanças públicas e a atividade financeira do estado tratam da arrecadação, gestão e aplicação de recursos públicos. Elas evoluem desde o feudalismo até os dias de hoje, passando por fases distinguidas pelos vários doutrinadores deste ramo do direito. De forma mais coesa, vemos a distinção de quatro fases: Estado Patrimonial, Estado de Polícia, Estado Fiscal e Estado Socialista.
O Estado Patrimonial é caracterizado pela confusão entre o patrimônio público e o patrimônio provado do rei. Aliás, na origem do estado, ele se confunde bastante com a figura do príncipe: "L'État c'est moi" (O Estado sou eu).
O Estado de Polícia, que surge no final do século XVIII, é um estado paternalista, intervencionista e centralizador que assume para si a função de garantir o bem-estar de seus súditos e do próprio Estado.
O Estado Fiscal é reflexo do Estado de Direito. Caracterizado por liberalista e capitalista, intervencionismo reduzido, percebe nos tributos a função de gerar recursos para o aperfeiçoamento de sua estrutura e defesa dos direitos. Divide-se em três fases: minimalista (restringia-se ao exercício do poder de polícia, administração da justiça e prestação de poucos serviços públicos); social fiscal (além de garantidor, intervém da economia, surgindo aí a tributação extrafiscal) e democrático e social de direito (diminui seu tamanho intervencionista, buscando o equilíbrio entre a justiça e a segurança, a legalidade e a capacidade contributiva).
Algumas teorias procuram explicar a atividade financeira do Estado: teoria da troca (Senior e Bastiat: os indivíduos pagam tributos e as comunidades efetuam serviços), teoria do consumo (Batista Say: o Estado não cria riqueza, apenas consome), teoria da utilidade (Gastão Jèse: produzir é criar utilidade), teoria da produtividade (Stein: as finanças consistem num complexo de meios pecuniários destinados ao exercício de uma indústria especial, numa transformação útil de riquezas materiais), teoria da grande indústria (Vitti di Marco: o Estado é uma grande indústria) e teoria das necessidades individuais e coletivas (Seligman).
A atividade financeira destina-se a prover o Estado com recursos financeiros suficientes para atender às necessidades públicas, envolve a arrecadação, a gestão e a aplicação destes recursos. Terá o Estado como atribuições promover ajustamento na alocação de recursos, na distribuição de renda e manter a estabilidade econômica. Portanto, ela é fiscal (arrecadar para aplicar) e extrafiscal (ou regulatória).
A ciência das finanças é ramo do conhecimento que estuda os princípios e as leis reguladoras do exercício da atividade financeira do estado, sistematizando os fatos financeiros. Ela observa e descreve os fatos relevantes, analisa abstratamente as causas e consequências e indica os meios ideais para alcançar os seus desígnios.
Um de seus grandes teóricos foi Adam Smith que publicou a obra "A riqueza das nações". É seguido por Keynes.
Esta ciência é orientada pela economia financeira (estuda os fatores da riqueza à disposição do Estado e indica os recursos financeiros que este pode obter), política financeira (estabelece as finalidades do estado e indica o que constitui interesse público) e técnica financeira (estuda a atividade do estado sob o ponto de vista prático, oferecendo métodos e sistematizações).
O Direito Financeiro é o ordenamento jurídico que disciplina a atividade financeira do Estado. É a partir do seu estudo que podemos chegar à conclusão de que os objetivos estatais independem da política adotada, encontram-se na Constituição.
Lembremos que o Direito Tributário é ramo didaticamente autônomo do Direito Financeiro - trata de sua mais importante receita: o tributo. Assim é que o Direito Financeiro engloba o direito tributário, o direito patrimonial público, o direito do crédito público, o direito da dívida pública, o direito orçamentário e o direito das prestações financeiras.
É didaticamente autônomo pois podemos identificar um conjunto normativo próprio, reconhecido pela própria Constituição, nos termos dos artigos a seguir transcritos:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:
I - sistema tributário, arrecadação e distribuição de rendas;
II - plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações de crédito, dívida pública e emissões de curso forçado;
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Art. 163. Lei complementar disporá sobre:
I - finanças públicas;
II - dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público;
Art. 164. A competência da União para emitir moeda será exercida exclusivamente pelo banco central.
Em sede infraconstitucional, podemos trazer a Lei 4.320/64 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4320.htm), que estabelece as normas gerais de Direito Financeiro e a Lei Complementar 101/2000 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp101.htm) que estabelece as normas de finanças públicas para a responsabilidade na gestão fiscal.
O Estado exerce o Poder financeiro através de sua soberania. Neste ponto, curioso é notar que denominamos o Estado, no exercício deste poder de Fazenda Pública. O Poder é de criar normas e vêm regular as formas de arrecadação, gestão e aplicação de recursos financeiros, conforme os interesses estabelecidos. Há quem estabeleça que daí surge (o que de fato não é impróprio) que daí surge uma relação jurídica financeira, que possui características de relação obrigacional ex lege de certa subordinação ao interesse público - e não veradeiramente de poder.
Mas não é qualquer relação ex lege, a Constituição é seu fundamento de validade, traçando os objetivos a serem seguidos, as formas para a sua realização, o rol de direitos e deveres que cabem ao cidadão.
Por Constituição financeira, denominamos o conjunto de regras constitucionais que cuidam da atividade financeira do estado. Agrupados os dispositivos podemos identificar os seguintes temas: competência normativa (arts. 24, 48, 52, 62 e 68 - os dois primeiro já transcrito), hipóteses de intervenção por descumprimento das obrigações financeiras (arts. 34 e 35), formas de fiscalização da atividade financeira (arts. 21, 70, 71 e 74), sistema tributário nacional (arts. 145 a 156 e 195), repartições das receitas tributárias (arts. 157 a 162), normas gerais sobre as finanças públicas e sistema monetário (arts. 163 a 164), disposições relativas ao orçamento (art. 165 a 169).
Recomendo a leitura (neste momento) dos referidos artigos.*
Pelo princípio federativo, também tratarão do tema as constituições estaduais (deixo aqui o link para a do Rio de Janeiro: http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/constest.nsf/PageConsEst?OpenPage) leis orgânicas (deixo aqui link de site para as leis orgânicas das capitais brasileiras: http://www.interlegis.gov.br/processo_legislativo/20020206082326/copy_of_20020905122346) do tema do direito financeiro, nos que for de interesse regional e local, respectivamente.
As fontes do direito, como sempre, podem ser divididas em matérias e formais (remeto à postagem sobre IED). As fontes materiais do direito financeiro são os elementos fáticos e concretos das normas de direito financeiro os acontecimentos econômicos e sociais, investigados pela ciência das finanças. Já são fontes formais as próprias normas jurídicas já citadas.
Aqui podemos lembrar a distinção entre lei nacional e lei federal: esta aplicável à União federal em suas relações jurídicas e aquela aplicável a todo, e a todos os entes federativos.
As normas gerais de direito financeiro são estabelecidas, segundo mandamento constitucional, por leis complementares (art. 163 e art. 165, §9º).
As leis específicas de direito financeiro são as leis orçamentárias anuais, as leis de diretrizes orçamentárias e as leis dos planos plurianuais - todas de iniciativa do poder executivo de cada ente federativo e aprovadas pelo respectivo legislativo. São leis ordinárias, cuja matéria é vedada à medida provisória.
Essas leis específicas têm natureza jurídica controvertida, para alguns trata-se de lei formal (já que não se distingue das demais) para outros lei material (traz conteúdo concreto), para outros ato administrativo (já que seria instrumento de arrecadação, gestão e aplicação de recursos). Daí haver problema quanto ao seu controle de constitucionalidade - já que este se destina à leis em sentido formal. Entretanto, o STF tem realizado este controle, o que pode ser que indique uma tendência a reconhecer seu caráter normativo.
Por fim temos os decretos, que deverão ser editados até 30 dias após a publicação das leis orçamentárias, para estabelecer a programação financeira e o cronograma de execução mensal de desembolso (art. 8º, LC 101/2000).
Numa próxima e breve postagem, vamos incluir o segundo ponto, que vai tratar das receitas e despesas públicas...
Bons estudos!!!
E boa sorte!!!
* Quando fazemos a leitura de dispositivos, é recomendável fazer remissões de grupos aos quais pertencem os dispositivos (assim anotem os outros artigos na lateral, com relação a cada grupo) e sublinhar, reforçando principalmente palavras de conteúdo negativo (com vermelho, por exemplo) e ressalvas (com verde, por exemplo).